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Foto: Camilo Lobo |
Não se trata apenas dos famintos literais, onde sem que haja justificativa grandes contingentes estão jogados, mas da carência de usufruto do simbolismo dessa mesma felicidade normativa, criada e incentivada por uma estrutura que está encontrando seus limites não antes ecológicos, como querem uns, mas primeiramente lógicos: por dar origem - a partir da concorrência mundial e desenfreada - a um exército de desempregados estruturais, subempregados e sem perspectivas que se veem alijados da participação no seio mesmo desse ordenamento que quer ser entendido como democrático e universal.
Óbvio está que este modelo, onde o sucesso se afirma predominantemente como projeto individualista (ainda que rendendo reverências a interesseiras trocas de favores) e que opera desintegrando os laços de solidariedade, não só não poderá estender seu paraíso para todos, como vai progressivamente expandindo o grau de exclusão e insatisfação reprimida.
Como já observou um pensador muito em voga nestes dias, “está mais fácil conceber o fim do mundo do que o fim do capitalismo”, e isso não pode mais ser lido na dimensão de uma figura de linguagem hiperbólica, senão como o que realmente diz: se continuarmos nos limitando a nos relacionarmos enquanto mercadorias e desejando a satisfação das mercadorias, os limites em que se encontram esse paradigma podem conduzir de fato ao fim do ser humano, ainda que paulatinamente e no desenho da obsolescência programada de aparelhos industrializados substituídos a cada meio movimento de translação da terra.
No entanto, não se trata de um caminho inequívoco e desde sempre inescapável. Como atestam os protestos, forças contrárias e oriundas dos limites desses postulados 'imperativos', criam mesmo a energia capaz de implodir o sistema sedimentado em valores hierárquicos e oligárquicos, a grande questão porém continua sendo percorrer e fomentar novos e não privativos caminhos de socialização para satisfação das necessidades materiais e simbólicas.
Júlio Reis é poeta, escritor, jornalista e colunista do ORNITORRINCO.