O Pére Lachaise é o cemitério mais visitado do mundo. Lá pode-se encontrar os túmulos do Oscar Wilde, Balzac, Edith Piaf, Jim Morrison e muitos outros. O lugar é lindo. Ruas de paralelepípedos que sobem e descem, lápides esculturais, corvos por todos os lados. Um programa para o dia inteiro, para chegar cedo e ir calmamente em busca da derradeira casa de todas essas figuras. Eu, que chegara tarde, me contentei em encontrar apenas o Balzac.
Paris também tem outro cemitério, o Montparnasse. Menos conhecido, mais parecido com o cemitério São João Batista (Rio de Janeiro), plano, bem menos poético. Entrei por acaso, nem sabia o que poderia encontrar. Fiquei mais empolgado quando vi na placa que lá jaziam Jean Paul Sartre e Simone de Beauvoir, Serge Gainsbourg, Julio Cortázar, Samuel Beckett e Charles Baudelaire. Sim, tinha encontrado meus companheiros, todos estavam no mesmo lugar. Precisava encontrar todos, e desta vez, tinha tempo.
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Gainsbourg foi fácil, pois em seu túmulo há dezenas
de flores, garrafas, peças de roupas, calcinhas, velas,
parecia um despacho, era o túmulo mais festivo de
todos. Resolvi ir em busca de Beckett.
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Mas quem eu queria encontrar mesmo era o poeta. Charles Pierre faz parte de mim. Sempre que o leio, vem uma sensação meio boba de ser poeta, ou tentar ser pelo menos. Pensei que não teria problemas, pois o cemitério Montparnasse, como disse antes, é plano e bem dividido.
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Cemitério Montparnasse |
Passei inúmeras vezes pelo local indicado e nada encontrei. Li centenas de lápides, entrei no meio delas, pensava que ia encontrar uma grande homenagem ao poeta, mas, nada. As horas foram passando, e um tipo de desespero foi me tomando. Achá-lo tinha virado questão de honra. Devo ter rodado o mesmo lugar umas vintes vezes. Parecia estar num labirinto. Até falei alto, chamei pelo poeta, mas, nada.
Cheguei a desistir por um instante, procurar o Cortázar, o Sartre, mas... não consegui. Até que vi, numa pequena lápide o seguinte texto:
Jacques Aupick. Général de Division, Sénateur, Ambassadeur à Constantinople et à Madrid. Membre du Conseil Général du Dept du Nord, Grand Officier de L'Ordre Impérial de la Légion DHonneur Décoré de Plusieurs Ordres Étrangers, Décédé le 27 avril de 1857, à lage de 68 ans.
Charles Baudelaire, son beau fils, décédé à Paris à lage de 46 ans le 31 août de 1867
Debaixo das medalhas e dos títulos militares de seu avô, encontrava-se o poeta Charles Baudelaire, morto dez anos depois. A lápide ainda continuava com a descrição de sua mãe, Caroline Archenbaut Defayes e de seu pai, Joseph François Baudelaire, terminando com a frase PRIEZ POUR EUX.
Enfim tinha encontrado o poeta, mesmo que sob a sombra do avô militar, lá estava ele. Feliz pelo encontro, não queria mais saber de Cortázar ou Sartre, até tentei achá-los, mas não consegui. Passei a caminhar lentamente pelo belo cemitério, ainda um pouco estupefato pela falta de consideração com o poeta. Um túmulo tão pequeno! Até encontrar, do outro lado, um monumento a Charles Baudelaire com uma estátua numa das ruas principais do cemitério, com direito a dois bancos para contemplação e descanso. Sabia que o poeta merecia mais e, de fato, teve sua digna homenagem.
De volta ao mundo dos vivos, satisfeito, saí do cemitério e fui encontrar o Daniel Castanheira.
Pedro Lago é poeta.