ROMA X GRÉCIA - O CLÁSSICO FUTEBOLÍSTICO



Épico é a definição mais correta para classificar o jogo entre as seleções da Grécia e de Roma. O que seria uma partida amistosa de preparação, como muitos já previam, tornou-se um histórico episódio bélico, digno das narrações antológicas do radialista Heródoto.

A Grécia veio com seu time principal. No gol, Homero, cego e capitão. A zaga, composta por Sófocles e Hesíodo. Nas laterais, Menandro e Aristófanes, formando assim um bloco defensivo potente, com Sófocles livre para sair ao ataque. Jogando de libero, Ésquilo é o dono da camisa 5. O meio campo sempre ofensivo apresentou suas armas mais fortes com Arquíloco, Kaváfis e Píndaro, que serviram ao ataque fulminante de Eurípides e Safo de Lesbos. Um timaço, no papiro e no campo.

O time do Roma (que gosta de ser chamado assim) tem fama de violento, e apresentou um scratch arrojado, com Petrônio no gol, Juvenal e Catulo nas laterais, Plauto e Terêncio na zaga, Lucrécio de libero, Virgílio e Lucano no meio e três atacantes, Sêneca, Ovídio e Horácio.

O técnico romano, Cícero, já havia alertado seus jogadores que enfrentariam muitos de seus ídolos, e que isso poderia atrapalhar no desenvolvimento do jogo. Mas, na prática, não foi isso que aconteceu.

O que vimos foi um início arrasador do time do Roma, sufocando a Grécia na defesa, não deixando que explorassem sua grande característica, o toque de bola refinado. E não foi por menos que os romanos abriram o placar, logo aos dez minutos da ampulheta, com um gol de falta de Horácio, em jogada ensaiada com Juvenal.

O time da Grécia, acostumado a vitórias, estava irreconhecível, com Safo isolada na frente, e um Píndaro apático na criação das jogadas. Aos trinta do primeiro tempo, Aristófanes já apresentava sinais de cansaço, devido às inúmeras investidas de Catulo pela lateral. Aristófanes corria pelo time todo. E tanto esforço defensivo acabou valendo a pena, pois os gregos, além de não terem sofrido mais gols no primeiro tempo, foram coroados com uma bela cabeçada do jovem Kaváfis no ângulo, sem chance para Petrônio.

O primeiro tempo mal terminara e a torcida grega já cantava “Queremos raça! Queremos raça!”. Sófocles quase não voltou para o segundo tempo, após forte entrada de Sêneca, aos 43.


A torcida romana gritava “Veni Vidi Vici! Veni Vidi Vici!” durante todo o intervalo. Júlio César, que estava em um dos camarotes, que pedia o esquartejamento do time grego, queria que seus jogadores jogassem como leões.

Mas alguma coisa aconteceu no vestiário grego. Talvez uma evocação dionisíaca, ou algo semelhante, pois o time voltou dançando para o segundo tempo. A torcida grega, que estava unida após tantos conflitos internos, parecia jogar com o time. Creta, Minos, Atenas, Tebas, todas as organizadas estavam juntas dando moral ao time grego “Sófocles é mal, pega um pega geral!”, “Quando a Safo toca a bola, o Olimpo deita e rola!”. O time parecia jogar por música.

Já nos primeiros quinze minutos, a incrível atacante Safo já havia marcado dois gols, ambos enfileirando a zaga romana. Plauto não via nada e Terêncio parecia encantado com a jogadora grega. Foi quando Virgílio chamou para si a responsabilidade e foi com tudo pra cima da zaga grega. Num lampejo de genialidade, diminuiu para os latinos com um gol de bico. Homero pareceu ter recusado defender chute tão feio.

A torcida romana acordou. “O o o o o Virgílio é sinistro!”, até mesmo tentando ofender a atacante grega com “Safo sapatão!, Safo sapatão!”. Porém, mostrando muita classe, a camisa onze da ilha de Lesbos mandava beijinhos para a torcida romana. “Vem que tem neném”.

A partida permaneceu disputada até os 40 do segundo tempo, e os gregos ainda venciam por 3 a 2, até que um lance polêmico mudou os rumos da peleja. Em ofensiva pela esquerda, Sêneca entrou sozinho na área e foi derrubado por Ésquilo. Penalty claro que o juiz persa, Xerxes, não deu. E aí veio a confusão. Sêneca partiu pra cima do juiz e foi impedido por Eurípides. A coisa esquentou, e Sêneca deu uma cabeçada no atacante grego, que revidou. Briga de Medeias! Os jogadores de ambos os times se atracaram num espécie de briga e abafa. No empurra empurra, Ovídio tentou cantar Safo, mas não obteve êxito.

Após quase dez minutos de paralização, o resultado não poderia ter sido outro: quatro jogadores expulsos, dois de cada time, Sêneca e Ovídio na parte romana, Eurípides e Safo, na parte grega, fazendo assim com que o juiz desse cinco minutos de acréscimo.

E o que se viu nesses cinco minutos finais foi algo da ordem do inacreditável. Com ambos os times abalados pelas perdas, a desorganização foi inevitável e o jogo ficou aberto. Aos 46, gol do Roma, com Lucano. Aos 47, outro gol do time romano, Horácio, aproveitando a desconcentração na saída de bola grega. Aos 49, o placar estava 4 a 3 para os latinos quando, Menandro, então apagado em campo, empatou para os gregos em arrancada épica. Os gregos avançaram em bloco e só não fizeram o quinto gol porque o juiz persa finalizou a partida aos 50 minutos, selando assim o empate em 4 a 4.

Após jogo quente, os jogadores se cumprimentaram em campo, sabendo que tinham vivido grandioso espetáculo. O técnico grego Heráclito de Éfeso disse na entrevista que seu time foi superior, e que me mereciam a vitória. Cícero, por sua vez, afirmou que “clássico é clássico e tudo pode acontecer, que os deuses nos ajudem na próxima”.

Ambas as torcidas aplaudiram seus jogadores, que atiraram seus lenços e brindaram com jarras de vinho. E o momento mais lírico foi o olhar de Homero para a torcida grega, como se estivesse de fato enxergando alguma coisa, pois, ao contemplar tamanha festa nas arquibancadas de pedras, uma lágrima caiu de seus olhos.

EVOÉ


Pedro Lago é poeta.