Cansados das festas particulares, dos grupos fechados e das ideias caretas de sempre, jovens de espírito livre vêm fomentando uma série de intervenções, festivais, rádios livres, encontros e festas em casas abertas, sem as chatices e mesmices do mercado coorporativo, onde marcas de cerveja e de celulares dominam o setor baladeiro, em megaeventos recheados de estrelas pop, bebidas caras, comerciais de TV e ingressos exorbitantes. Em paralelo, esses mesmos jovens promovem a democratização do conhecimento e da cultura, pregando a liberdade de expressão, a política da boa vizinhança, o consumo de alimentos naturais (e muitas vezes, vegetariano) e a evolução espiritual individual, sem obscurantismos, regras ou rituais pré-estabelecidos e com uma horizontalidade de poderes, onde ninguém é mais importante que ninguém e todos têm algo para aprender, para ensinar, e principalmente, compartilhar.
O conceito de casas abertas, crescente na comunidade curitibana, segue justamente essas linhas. Já tive a oportunidade de conhecer três casas diferentes, mas com propostas semelhantes. Normalmente em uma casa, três ou mais jovens dividem as despesas domésticas e juntos promovem uma série de atividades e oficinas no mesmo espaço, além das costumeiras festas igualmente abertas, regadas de arte, performances teatrais e música de qualidade e independente. Às vezes, paga-se uma entrada, que não costuma passar dos cinco reais, enquanto bebidas e comidas naturebas são vendidas separadamente, a preços justos. Nas oficinas, em geral gratuitas, as pessoas aprendem técnicas de pintura, fotografia, música, culinária vegana e até malabares, além das práticas coletivas de meditação, yoga e o que mais a imaginação permitir.
Muitos desses grupos têm nomes próprios, os chamados “coletivos”, comumente formados por artistas, estudantes e profissionais liberais da área da saúde, ou ainda da medicina complementar. Jovens com tendências políticas anárquicas e/ou socialistas, no melhor sentido que esses termos possam ter.
O sistema vigente não mudará, o capitalismo continuará fazendo suas vítimas, os meios de comunicação em massa e os políticos continuarão corruptos até os ossos, a educação seguirá precária, porém há sim algo para se fazer. E essas comunidades (muitas, já autossustentáveis), essas casas abertas, formadas por cabeças jovens, cansadas de receberem ordens, cansadas de terem que dançar uma música não escolhida, cansadas dos mesmos canais de comunicação, dos mesmos líderes decadentes e das mesmas opções nos cardápios, cada vez mais caros, enfim, essas comunidades abertas parecem apontar a direção que deveríamos seguir.
De algum modo estranho, os protestos do ano passado seguem ecoando e as mudanças estão ocorrendo em doses homeopáticas, em corredores invisíveis e sem líderes ou partidos. Essas mudanças partem de seres humildes e com ideais libertadores, cheios de luz e força de vontade para criarem uma nova ordem, positiva e humana, com valores reais e sonhos coletivos possíveis. Os sonhos são coletivos, mas o trabalho será sempre individual e livre, respeitando as limitações de cada ser humano, e sem as classificações ilusórias de acordo com aparências. Os hippies estão de volta e estão mais conscientes do que nunca. A nova era, profetizada nos anos 80 pode estar sendo construída debaixo dos nossos olhos.
Igor Moura é escritor, artista plástico e cineasta.
* Imagem: Ana Noble