A SEMANA DE NOTÍCIAS OU AS NOTÍCIAS DA SEMANA


Pepe Mujica se foi. Não do mundo, mas da presidência. E a coração valente, será mesmo valente? Até quando vai tomando porrada? Ou vai ou já está rachado? De longe, me assusta a ideia de uma nova marcha da família. Os movimentos se movimentam. Sessenta e dois anos depois, o petróleo ainda é nosso. E há de se brigar por ele.

Na Rússia, um líder de oposição é assassinado. Milhares marcham. Olhos da mídia para Putin. Os americanos sempre se voltam para Putin. Os americanos não suportam Putin.

No Brasil, um empresário lidera uma greve de caminhoneiros. E os repórteres da Veja inventam sobrinhos de Lula.

Em Nova York, jovens são presos a caminho de se juntarem ao Estado Islâmico. Se eu escrever Estado Islâmico em inglês, será que o Obama bate à minha porta? ISIS. Vamos ver.

O correspondente da CNN fala na TV sobre a possível identificação do homem que aparece nos vídeos de decapitação do Estado Islâmico. Eles o apelidaram de Jihadi John. E ele pode ser inglês. ‘Se ele é um cidadão britânico, ele tem direitos’, o correspondente diz. Fala-se muito dizendo-se pouco.

Alguns vestidos mudam de cor.

Para acompanhar minha esposa, a trabalho, voo para Miami. Um homem de esquerda em Miami é contradição suficiente. Cynara de Menezes diz que esquerda Miami é imperdoável. Mas a Flórida festeja: Rodrigo Constantino anunciou que está de malas prontas pra chegar.

HSBC? Que HSBC?

Em Los Angeles, a Academia considera Birdman mais filme que Boyhood. E acaba a vida longa e próspera de Leonard Nimoy.

Em São Paulo, falta água.
E Guido Mantega é hostilizado em um hospital nobre - nobre? Guido acompanhava a esposa, em tratamento contra um câncer.

Um embrulho no meu estômago. Não é câncer.

E as notícias da África. Onde estão as notícias da África?

Haverá um lugar no mundo sem notícias?

O Rio de Janeiro completa 450 anos. Alguns dias antes, Alan, um menino de 15, negro, que brincava com amigos na comunidade da Palmeirinha, foi baleado pela PM e morreu. Porque estava correndo.

Lembro quando eu tinha, sei lá, talvez 15 anos. Voltava correndo da casa de uma namorada, há algumas quadras do meu prédio, em Laranjeiras. Tinha medo de andar sozinho na rua, à noite. Cruzando uma rua, dei de cara com um carro da polícia.

– Está correndo por que?

Eu era ingênuo. Pensei que ele estava preocupado comigo, imaginando que eu estivesse correndo de alguém, fugindo de uma ameaça. Já disse que eu era ingênuo?

– Estou correndo porque eu quero.

– Então o oficial também vai te dar uma geral porque ele quer.

Eu não tinha nada. Nenhum tiro foi disparado. E eu fui pra casa. Andando.

Leio que houve comoção com o vídeo que o menino gravou mostrando tudo e contradizendo a versão da polícia, de que se tratava de um auto de resistência. Não acho reportagem no principal telejornal do país. Trata-se de uma questão regional, aparentemente. E se fosse eu? Menino branco, classe média, zona sul?

Estou em Nova York. Alan está morto. Seu amigo, Chauan, também um jovem negro, sobreviveu, e está com uma bala alojada no peito. Não há desigualdade maior do que a perversidade de ter sua vida determinada por onde você nasce. Nascer é estar condenado. Mas alguns estão mais condenados que outros.

Quando assisti ‘Seven’, nunca me esqueci da citação final. Somerset, personagem de Morgan Freeman, diz: “Ernest Hemingway escreveu uma vez, ‘O mundo é um bom lugar, pelo qual vale a pena lutar. Eu concordo com a segunda parte”.

E eu concordo com você.



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LUCAS GUTIERREZ
Ator, escritor, jornalista e colunista do ORNITORRINCO


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